O que andei lendo: Leonardo Guelman

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capa_livroGentileza gera gentileza. Nos idos dos 80, chegando de ônibus à rodoviária Novo Rio (nunca entendi esse nome…), me surpreendi com a frase insistente em diversas pilastras sob o viaduto do Caju, lúgubre cartão postal revelado a quem chega ao Rio de Janeiro. Cheguei a divisar algumas vezes a figura do profeta, sua túnica e barbas brancas, um olhar esperto e um sorriso de quem sabe que a imensa maioria está sonâmbula. José Datrino, o Profeta Gentileza (1917-1996) se fez profeta em 1961, após um acontecimento que assombrou Niterói seis dias antes: o incêndio do Gran Circus Norte-americano, que matou mais de 500 pessoas. Acordado por vozes ancestrais, decidiu abandonar a família e seguir uma senda que o levaria ao encontro da sua particular filosofia, a da gentileza que gera gentileza. E aí está seu aspecto mais interessante. Da sua vivência, da sua experiência de vida, Gentileza constrói uma visão de mundo baseada na gentileza: “por gentileza” (em vez de por favor, pois o favor exige algo em troca) e “agradecido” (que vem de graça, não de obrigação) são as senhas para sua ética num tempo em que o “capetalismo” (sim, do próprio) nubla os olhos da grande maioria que caminha pela urbe atrás do dinheiro. “Não usem problemas não usem pobreza usem amorrr gentileza”, é a máxima inscrita no bolso de sua túnica. E segue a pregação: “Como salvar o nosso mundo profeta gentileza de tanta maldade queimando a pior praga assasino que escraviza sugesmundo e o destruidor da natureza que tentanta riqueza e beleza esta ea praga capetalismo surdos cega mata conduz ao bismo”.

Leonardo Guelman percebeu nesse saber popular uma ontologia (parte da filosofia que trata do ser), e construiu uma dissertação de mestrado – orientada por Leonardo Boff – desvelando não só a figura do profeta mas a sua particular linguagem, expressa em seu auge nas 56 pilastras do viaduto do Caju, uma obra urbana aberta. Esta mesma obra foi tombada e restaurada em 1999/2000, por iniciativa do mesmo Guelman. Sua análise da filosofia da gentileza, que está em Univvverrsso Gentileza (Mundo das idéias, Rio de Janeiro, 2009) é primorosa ao revelar que sob a escrita particular do profeta há uma cosmovisão (visão de mundo) restituidora de um mundo onde os atributos são “gentileza amorrr beleza perfeição bondade e riqueza a natureza”. Em tempo: amor divino é amorr, para o profeta.

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Circo Piolin

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oswald-e-piolin1Galdino Pinto se apaixonou por uma artista de circo quando ainda era estudante em Rezende (RJ), abandonou o cartório que se pai havia adquirido e seguiu viagem, casando-se em Amparo (SP). Foi empresário do Circo Takesawa Manje e, depois, atuou como palhaço. Seu filho, Abelardo, nasceu em 27 de março de 1897, em Ribeirão Preto (SP). Sete anos depois, passou a atuar no Circo Americano, propriedade de Galdino, como contorcionista. O palhaço Piolin nasce em 1917 na cidade de Manhuaçu (MG), quando se vê obrigado a substituir o palhaço Espiga, que após comprar seu próprio circo, foi-se sem dar explicações. No Circo Americano, fez par com Martinelli e, depois, com seu irmão, Faísca (1918 e 1919). Quando, em 1926, sua fama chegou aos intelectuais modernistas, ele já estava no Circo Alcebíades, de Alcebíades Pereira, filho do precursor Albano Pereira, no mesmo Largo do Paissandu, depois de passar seis anos no Circo Irmãos Queirolo, onde substituiu Chicharrão, o grande palhaço daquela família. A partir do início dos anos 1930 é que monta, enfim, um circo com o próprio nome. Será um dos mais longevos do país, tendo encerrado suas atividades somente em 1961, quando a prefeitura de São Paulo tomou o terreno onde seu circo estava montado.

Circo Irmãos Seyssel (França, 1886)

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img019O Circo Fernández chega ao Brasil em 1886 e traz entre seus artistas o palhaço Augusto Seyssel. Seu filho, Fernando, também é palhaço, o Pingapulha. Junto com o irmão Vicente, que atua como clown, funda, em 1922, o Circo Irmãos Seyssel. Em 1927, Fernando adoece e precisa de um substituto. A escolha recai sobre o filho desajeitado, Waldemar, que vira o palhaço Arrelia. Junto com seus dois irmãos, Paulo e Henrique, assumem o circo, mantendo o nome, até seu final, em 1953, quando este paga fogo. Arrelia, naquele ano,se tornaria um grande ídolo da televisão, com seu cirquinho preenchendo as tardes da TV Record até 1974.

Circo Savala-Baxter (Argentina, 1895)

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2478CAREQUINHAJosé Rosa e Teófila Taylor Savala, ele peruano e ela argentina, chegam ao Brasil em 1895, com sete filhos, entre eles Rosa, que conhece em 1908 no Rio de Janeiro o engenheiro da Light Robert Mac Baxter. Ele segue com o circo e se torna domador, o Capitão Baxter, casando-se com Rosa. Têm sete filhos. Alguns deles se tornam palhaços, outros acrobatas, e atuam em várias outras companhias circenses. Faz parte da família o excêntrico George Savala Gomes, o Carequinha, também pioneiro em programas de televisão.

Circo Olimecha (Japão, 1888)

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Charles Frank, filho do patriarca Haytaka Torakiche, de Osaka, Japão (este, ao decidir correr mundo com seu circo, prefere facilitar a pronúncia do seu nome, mudando-o para Olimecha), chega ao Brasil em 1888 e passa a assinar Carlos Franco Olimecha depois de se casar. Tem sete filhos e uma filha. Apresenta-se a princípio com a trupe japonesa herdada do pai. Depois vai a Buenos Aires, onde se engaja no Circo Frank Brown. Voltando ao Brasil, decide montar seu próprio circo em 1900. É especialista nos números ginásticos. Manuelito, filho de Carlos, domina a modalidade salto duplo com pirueta entre 1908 e 1935, um recorde. Também é sob a lona dos Olimecha que surge a dupla de irmãos Alda e Américo Garrido, que se tornam cômicos, montam trupe e encenam uma série de peças de temática caipira.

Circo Albano Pereira (Portugal, 1871)

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fuzarcaChega a Porto Alegre (RS) em 1871 na trupe do Circo Chiarini. Quatro anos depois se torna proprietário do Circo Universal ou Circo Zoológico Universal e constrói um pavilhão em Porto Alegre. Faz muito sucesso na Corte, e tem o próprio Imperador entre os apreciadores de seus números eqüestres. Prima sempre pelo luxo no seu circo. Dizem que nas frisas há sedas e estofados, veludos e flores naturais. Em 1903, com o circo montado em Rio Novo (MG), estava cumprimentando o público que entrava para o espetáculo quando foi atingido por uma bala perdida, morrendo a seguir. Dá continuidade ao circo seu filho mais novo, Alcebíades, que monta lona própria em 1917, inaugurada em Campinas (SP). Alcebíades era um clown, ou cara-branca, que se apresentava em roupas luxuosas. Associou-se ao palhaço Piolin, com quem dividiu cinco anos de sucessos no circo instalado na Avenida São João, região central da cidade de São Paulo. Alcebíades é pai de Albano Pereira Neto, o palhaço Fuzarca, que, junto com Brasil José Carlos Queirolo, o excêntrico Torresmo, serão os primeiros palhaços a estrearem um programa na televisão em 1950, atração que permaneceu por dez anos no ar (ambos na foto).

Circo Queirolo (Uruguai, 1912)

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O tenor lírico uruguaio Giacomo Queirolo vai estudar na Itália e acaba arrumando um emprego de cultor de bel canto num circo. Um de seus onze filhos, José Carlos Queirolo, se casa com Petrona Salas em Buenos Aires, na Argentina, e têm sete filhos, entre eles Alcides (que, por sua vez, é pai do palhaço Ripolim, Alcides Serrat Queirolo), José Carlos (o palhaço Chicharrão), Julian (o clown Harris) e Otelo (o palhaço Chic-Chic). Com a morte do patriarca da família, a mãe Petrona resolve montar uma grande trupe, os Irmãos Queirolo, que chega ao Brasil em 1912. Numa temporada em Bagé, no Rio Grande do Sul, em 1915, José Carlos Queirolo cria o palhaço Chicharrão, nome tirado de um personagem de quadrinhos publicados na revista argentina Caras y Caretas (Biruta e Chicharrão). O excêntrico cria a imagem que irá prevalecer entre seus futuros seguidores, entre eles Piolin, a do palhaço com chapéu coco, colarinho largo, sapatos enormes e bengala grossa. Chicharrão foi ainda o criador de números antológicos, entre eles o da “barata sorumbática” (um carro de madeira com um cachorro preso ao chassi que, para andar, tentava alcançar um osso pendurado numa vara conduzida pelo palhaço) e do “idílio dos sabiás” (pantomima em que a dupla de palhaços encena o namoro dos dois pássaros a partir de um diálogo de assovios), número que celebriza Piolin, seu discípulo e substituto no Circo Queirolo. Dele, disse Yan de Almeida Prado:

Não se pode falar de circos em São Paulo sem fazer referência à irmandade Queirolo. Indubitavelmente foram os que mais fizeram pelo espetáculo circense entre nós. Tornaram o seu barracão uma verdadeira escola de cômicos de primeira ordem. No seu âmbito formaram-se os conhecidíssimos Piolim, Chicharrão, Harris, Chic-Chic e outros que não se pode conhecer. Nem os mestres sabem quantos são, porque é difícil contar os que aprenderam olhando-os, de longe, trabalhar. Os alunos, perdidos na assistência, assimilavam e, mais tarde, por este mundo afora, passaram a exibir-se, sem confessar onde tinham adquirido os meios de sucesso.

Circo François (França, 1881)

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François

Tem origem em Jean François e sua mulher Ana Stevanovich, que chegam ao Brasil em 1881 e passam a atuar como mambembes. Em 1903, a família instala um luxuoso circo na capital, no Largo da Sé. Em 1907, viajam para a Argentina e o Uruguai, trazendo uma tropa de 14 cavalos dos pampas, que passam por intenso adestramento. Jean François transforma seus filhos – eram 14 – em exímios jóqueis. Além disso, importa um gerador de eletricidade Otto, da Alemanha, e um projetor de filmes Pathé, da França, isso quando o lampião a gás ainda imperava nas cidades. Em 1916, exibe a “Pantomima aquática” num tanque de 80 mil litros de água instalado no picadeiro. “E ali se remava, se nadava, se mergulhava, para maravilhar a platéia.” Para estabilizar sua vida com a chegada dos filhos, decide transformar seu circo em pavilhão. A princípio monta um palco ao lado do picadeiro, mas, depois, acaba restringindo o espetáculo às encenações, criando uma estrutura portátil e desmontável em alumínio para o pavilhão, que apresenta dramas e comédias em pantomimas, isso em 1924. O Pavilhão funciona até 1935, quando Jean François morre. O circo é retomado e mantido em atividade até 1962, pelas mãos de Hilário de Almeida, que se casa com Maria François.